sábado, 15 de abril de 2017

Sete Hábitos para Infelicidade (Introdução)

A foto dessa reflexão ilustra bem o que iremos discutir, nos próximos dias.
Trata-se da construção da fundação de uma residência, de seu alicerce. As madeiras funcionam como moldes, fazendo uma espécie de caixa na qual o concreto será depositado, entre ferros.
Quando o concreto secar, elas serão retiradas, e o alicerce estará firme. Hábitos são assim, como essas formas de madeiras, são moldes que nos dão segurança, que nos capacitam à ação, perante uma situação que vivemos.
Ou seja, os hábitos moldam em nós padrões de comportamento, rotinas, manias, costumes que visam, no limite, simplificar, racionalizar ou padronizar nossa existência. São importantes resultados de aprendizados, pois sedimentam valores culturalmente e socialmente compartilhados.
Contudo, nem todos os hábitos são virtuosos, positivos e que levam ao crescimento. Existem hábitos entrópicos, que roubam energia, que contribuem para a involução do ser. Para o seu não desenvolvimento.
Pense no hábito de dormir até mais tarde, aprendido nas férias. Ao retorno ao trabalho ou estudos, este hábito precisará ser desaprendido, e logo. Assim como ele existem centenas de hábitos que precisamos desaprender, dando lugar a outros mais saudáveis e que elevem nosso ser, atualizando nossa existência.
A educação é o principal vetor de renovação de nossos hábitos.
Ela nos capacita ao aprendizado de rotinas que respondam melhor às mudanças de ambiente e contexto, fundamentais ao crescimento do ser, e a uma existência plena.
Identificar os hábitos ruins, negativos, que dificultam o crescimento do bem-estar é uma questão de saúde pública.

O que me levou a conversar contigo, sobre os sete hábitos para a infelicidade, foi um email que recebi de um amigo. Nele, o amigo pedia uma orientação para um padrão de comportamento que sentia que estava criando raízes nele: o da infelicidade.

Seja no trabalho, seja no casamento, seja na relação com os filhos, seja até na relação com os amigos.
Sempre estava sentindo-se em falta, ou que faltava-lhe algo para ser feliz.

Ele me revelou que sentia uma vontade danada de partir para um lugar distante e ali descansar.
Aí liguei para o amigo. Têm coisas que precisamos da voz, ou da pele, para melhor ponderá-las.

Soube então que o sentimento de infelicidade dele aumentava quando ele postava suas insatisfações, nas redes sociais, e um coro de descontentes, como ele, as endossava. Ampliando ainda mais as suas percepções de sofrer: com votos de apoio, curtidas e comentários na mesma linha.

Para piorar, ele passou a cobiçar as vidas dos "vizinhos de rede social", para os quais ele achava que a vida não tinha problemas. Não sabia ele que ali são vidas editadas, privilegiando na edição os bons momentos.

Naquele manhã, ele acordou muito cansado de si mesmo. Estava a ponto de estourar.  A gota d´água foi uma discussão boba com sua esposa, por conta de uma tarefa doméstica sempre adiada.
No email, ele me diz que sente vontade de sair sem destino.
Lembrei-lhe do Salmista, que teve esse mesmo sentimento: "Ó quem me dera asas como de pomba! Então voaria, e estaria em descanso. Eis que fugiria para longe, e pernoitaria no deserto."  Salmos 55,6-7

Ter esses sentimentos é normal, em ocasiões da vida.  Mas, se não atacarmos o fluxo por onde eles correm, o da infelicidade, o quadro poderá se agravar derivando em depressões, ou, no extremo, em  suicídios ativos ou passivos de todos os tipos.

"Como assim o fluxo da infelicidade, Ricardim?"

Nossos sentimentos, ao longo de nossa história, vão aprendendo a correr como num leito de um rio.
A água são os pensamentos. O leito, nossos hábitos emocionais.
Não adianta querer ser feliz, conduzindo essa água pelo mesmo leito, que por anos foi esculpido na rocha de nosso ser.
Temos que mudar o leito do rio. E isso é lento, exige paciência, autocontrole, autoconhecimento e abertura ao novo. Lembro-lhe, o leito são as emoções, a água os pensamentos.
Os seja, alterar hábitos da vida exigirá um trabalho enorme.  Alterar hábitos de vida é alterar o fluxo, o leito.
Mas, garanto-lhe a mudança será da ordem de uma metanoia, uma mudança profunda, quando alteramos o fluxo, o leito.
Altere o curso do rio, remodelando a forma como habitualmente processa os pensamentos e emoções de tua vida.
Leve suas águas para outros leitos, menos pedregosos de si mesmo.

Desaprenda hábitos, ou padrões de comportamento que te conduzirão, com certeza, à infelicidade.

Como assim, Ricardim?

Amigo, durante anos somos treinados a esculpir o curso do rio de nossas emoções por leitos rochosos, pelos caminhos da infelicidade. Isto acabará por criar hábitos - hábitos são padrões de comportamento aprendidos.
Quem nos treina são as famílias, escolas, amigos, igrejas e trabalho.
Padrões de comportamento que se replicam em todas as áreas de nosso viver, mesmo que nos mudemos dela: casamento a casamento, amigo a amigo, trabalho a trabalho, cidade à cidade, etc à etc... tudo repete-se mais cedo ou mais tarde. Pois, a força do hábito não renova a existência dessas vivências, apenas as atualiza, com os mesmos padrões de comportamento do velho - o do já vivido.

Hábitos que vão criando as condições das pessoas ficarem sempre extremamente infelizes.
Falo "extremamente", pois um pouco de infelicidade é sinal, também, de saúde mental.

A tristeza eventual e em episódios de luto, e as dificuldades, fazem parte do pacote do viver, e temos que beber desse cálice.

Sem querer esvaziar o tema, enumerarei nos próximos posts, os sete hábitos para a infelicidade, que precisamos desaprender urgentemente, tal qual o exemplo do hábito de dormir até mais tarde, re-aprendido nas férias de alguns.

Conversar sobre esse tema, para mim, é uma questão de cidadania, de engajamento na busca de uma saúde coletiva de maior bem-estar.  Nos tempos atuais, testemunhamos uma epidemia de falta de sentido na vida - com multidões de homens-zumbis carregando os fardos de sua existência, cujos hábitos moldaram estilos de vida calcados fundamentalmente no ter, prazer e poder, levando-lhes à uma frustração de sentido.  Aprender novos hábitos de vida, ao desaprender os hábitos de morte, faz-se urgente e necessário ao bem viver. Trata-se de uma questão de saúde e de educação social.

terça-feira, 11 de abril de 2017

O Humano do Digital - Por Ricardo de Faria Barros (*)


Qual é o Humano do digital, nas Competências para o negócio e trabalho, nos tempos atuais?

Com essa pergunta, abrirei minha participação no Segundo Fórum Trilhas de Aprendizagem: Gestão por Competência em Empresas Públicas e Privadas, que acontecerá em Brasília, de 12 a 13/09/2017, produzido pela Inteletto. (www.inteletto.com)

Antecipo algumas reflexões que ali serão proporcionadas. Nunca esquecerei o dia em que meu gerente perguntou se eu tinha WhatsApp, em setembro de 2013. E, até parece que foi no século passado. Olhei para ele, totalmente “ignorante" no assunto, e com a minha melhor cara de paisagem soltei um: “Uotezape o que?”, eu não sabia o que era aquilo, e estava à margem daquele mundo digital.
Chamei um estagiário que passava por perto, pedindo-lhe que me ensinasse o tal do “uot”, e aprendi.
Hoje, de meus pais à Casinha Mineira, aqui no DF, todo mundo “Uota” pra todo mundo.
Com ele negócios são fechados, namorados namoram, famílias se reencontram, amigos interagem, e até trabalho são trabalhados.
O celular virou algo que até dá para nele se telefonar. Mas, isso deixou de ser o seu atributo principal. Quem diria!
Nessa sociedade conectada e em rede, as possibilidades de novos negócios, interação social, produção de conhecimentos e co-criação de bens, produtos e serviços, avançam a passos largos. Com forte impacto no desenvolvimento de competências, e até nos modelos de negócios, como exemplo o dos Bancos.
Sem prejuízo de outras competências, e sem querer esgotar um tema tão rico, listo quatro competências com “viés de alta” na economia digital em que vivemos:

1. Comunicação Não-Violenta - Desenvolver uma comunicação de qualidade, empática e eficaz com os outros, fazendo as devidas distinções entre: observações e juízos de valor; opiniões e sentimentos; necessidades e estratégias; pedidos e exigências. Ela se expressa também em práticas restaurativas de administração de conflitos. Essa talvez seja a mais catalisadora e humana das competências oriundas da nova economia digital.

2. Letramento Digital - Ser capaz de buscar, avaliar, criar, distribuir e operar as mais diversificadas fontes e canais tecnológicos, cada vez mais será uma das fontes de riqueza das organizações. Explorar e aproveitar as potencialidades das mídias e redes sociais, da web, das plataformas de interação e dos sistemas eletrônicos de automação produtiva virou a regra, não mais a exceção. Na sociedade digital, não há mais separação entre presencial e virtual. O negócio e trabalho acontecem em todo lugar, e a todo momento, exigindo um contínuo processo de desenvolvimento nas competências técnicas e humanas. Saber aproveitar os mais diversificados recursos de interação e de posicionamento empresarial, com uso dos canais tecnológicos, poderá fazer a diferença na competitividade empresarial.

3. Interação Produtiva Apreciativa – Seria como se pudéssemos combinar o trabalho em equipe, o relacionamento interpessoal e a produtividade. O fazer coletivo supera o paradigma do espaço x tempo, com atuações inovadoras em redes coletivas de produção de significados e labor. Ela se expressa na capacidade de compartilhar competências em busca de objetivos comuns, apreciar as contribuições dos outros, acolhendo-as e em cima delas operar, interagir positivamente com pessoas e em ambientes, e na construção coletiva de soluções de bens, produtos ou serviços maximizando a experiência do cliente. Crescerão os espaços pedagógicos de Design Thinking (um novo jeito de pensar e abordar problemas, com o pensamento centrado no usuário) na busca por inovações.

4. Artesanato do Sentido e da Resiliência Restaurativa. Equipes menores, demandas maiores, sobrevivência organizacional colocada à prova todos os dias, além de impensáveis entrantes no mercado, impacta diretamente a qualidade do ambiente no qual se configura o trabalho, e a percepção de seu sentido. Portanto, a capacidade individual, ou coletiva, de restaurar o tecido emocional positivo do trabalho, será vital à saúde do trabalhador e ao clima organizacional, com impactos na produtividade. Todos precisarão ficar vigilantes a um possível crescimento do desânimo, intervindo imediatamente nesse processo, antes que ele altere por completo a percepção e satisfação no trabalho, e até venha a degradar o ambiente laboral. Como um trabalho de artesãos, essa competência terá várias formas de se expressar, adequando-se às realidades locais. Mas, em toda as suas formas estará presente o desafio de revestir as coisas de sentido, de recuperar o vigor e ânimo, após o enfrentamento de situações-limites, restaurando o vigor e tenacidade do time.

Nesse particular, a atuação e formação dos gestores será ainda mais vital. Para que no exercício da gestão eles possam desenvolver suas equipes, serem líderes eficazes, procedendo com suas práticas à restauração da resiliência do grupo, e a ressignificação permanente do sentido do trabalho.

Essas quatro competências se combinam sinergicamente potencializando os resultados, uma das outras. Em resumo, os novos tempos que já chegaram, exigirão uma maior capacidade de diálogo com o diferente; aprenderes da gestão social de redes, canais e instâncias digitais que favoreçam o fortalecimento dos elos produtivos; a capacidade de criar coletivamente, tijolo a tijolo, exigindo desapego cognitivo e doação generosa de saberes; e, por último, uma nova postura gerencial, que os times passam a exigir dos líderes, como a de serem artesãos do sentido do trabalho e fomentadores da renovação da resiliência, individual ou coletiva.

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O autor é professor do IBMEC, aposentado do BB, proprietário da Ânimo – Desenvolvimento Humano; Autor dos livros: Sobre a Vida e o Viver, e, Apanhadores de Possibilidades nos Campos do Infinito; Psicólogo (UEPB), Mestre em Gestão Social e Trabalho (UNB), Especialista em Gestão de Pessoas (USP) e membro da Associação Internacional de Psicologia Positiva. Publica seus textos também no blog de desenvolvimento pessoal e profissional em: https://bodecomfarinha.blogspot.com.br .

quarta-feira, 5 de abril de 2017

Sabotadores Atitudinais do Desempenho Profissional (Autor Ricardo de Faria Barros)

Durante a carreira profissional, pode-se sentir em maior ou menor grau a força de sabotadores que afetam diretamente o desempenho no trabalho. Verdadeiros vilões da entrega de resultados organizacionais.
Destaco alguns, para os quais deveremos ter muito cuidado e vigiar a sua evolução, agindo de imediato sobre eles, para reduzir seu crescimento e a intensidade de sua força.

a. O Distraidor – O acesso a inúmeras formas de comunicação e interação social, mediados pelos dispositivos móveis e computadores, pode estar gerando uma enorme dispersão e perda de produtividade no trabalho. Tirando o profissional do foco e o distraindo dos objetivos do trabalho. Alia-se a esse fenômeno os espaços coletivos de produção, desafio crescente à concentração nas atividades. E, de interrupção em interrupção, para acessar Facebook, WhatsApp, Instagran, Twiter, Snap e o escambau perde-se o fio da meada do que estava sendo feito. Ou até sobra para o cliente. E o rendimento é afetado por tantas paradas para acessar as mensagens, ler um monte de e-mails: “Para conhecimento”, etc. O pior é que esse sabotador nos faz crer num falso poder que temos de nos desligarmos do trabalho, sem se perder do caminho que estávamos trilhando, ao para ele voltar. Alguns, ainda se sentem culpados por não responderem ou olharem as mensagens on-line que recebem. E até são cobrados por isso pela sua rede. Como se tivéssemos que estar 100% on-line para os amigos. E o vício digital se estabelece, ficando dependente de interações comunicativas, de toda natureza e origem. Sem criar limites, regras e barreiras ao seu consumo. O distraidor sabota nossa concentração.

b. O Prorrogador – É aquele sabotador que atua em nós distorcendo a percepção do tempo, adiando o que está para se fazer. Ele gera uma falsa sensação de controle sobre o risco, dos adiamentos do que é preciso ser feito. E aí, as coisas vão se acumulando, gerando nesse profissional a sensação de que os dias não tem horas suficientes e que ele sempre está em atraso com o relógio, com a vida e com ele mesmo. As coisas vão se acumulando, para amanhã serem feitas. Com o tempo, esse profissional fica desacreditado do grupo. E passa a ser visto como alguém que não cumpre prazos, ou que não cumpre o que prometeu, sempre com um bom motivo para adiar. E, de procrastinar em procrastinar, ele fica craque em terceirizar culpas e não assumir responsabilidades. O bom procrastinador sempre tem uma boa desculpa para nela se apegar, tornando-se expert em justificativas pelos não feitos, não entregues. O prorrogador atua sabotando resultados.

c. O Iletrado Emocional – É o terceiro vilão das carreiras. O trabalhador deixa de se evoluir nas competências da inteligência emocional. Esse sabotador se manifestará na redução das práticas de empatia, de interação social positiva, de resiliência laboral e de bem-estar emocional. Desenvolvendo-se apenas nas competências técnicas, relativizando aquelas de natureza comportamental. Desaprende a conviver, a ser flexível, tenaz e cooperativo. Sob estresse, explode facilmente. E vive manipulando as pessoas, ou oprimindo-as. Adora cultivar emoções ruins. E o próprio grupo o tem como depósito ou porta-voz de notícia negativa. E ele aceita esse papel. Com o tempo, ele vira um reclamão e rabugento, nada mais estando bacana com ele, com o outro, ou com a realidade. O Iletrado Emocional atua sabotando a motivação.

d. O Apático – É o quarto vilão. Quando ele atua o trabalhador deixa de sentir tesão em perseguir metas, em procurar oportunidades de carreira, em se capacitar, e até em aprimorar processos. Ficando com sua existência embotada. No piloto automático da vida. Esse vilão age pela apatia. Esse talvez seja o sabotador menos visível e o mais difícil de ser detectado. Exige autoconhecimento. O pior é que esse sabotador atua desligando esse termômetro interior, e a pessoa perde a consciência do que lhe está ocorrendo. Ela precisa de ajuda, mas não pede. E, paulatinamente, essa raiz da apatia vai se embrincando em tudo. Tendo como um de seus combustíveis a tensão negativa, entre as expectativas e a realidade. Ansiando, de forma extremamente idealizada, por: colegas diferentes, chefias, empresa e até o próprio trabalho. Aí, ao não receber o que espera, se frustra e vai ficando cada vez mais murcho, desanimado, apático. O apático encontra na realidade as razões para desistir de fazer e acontecer, de mudar, de mudar a realidade, ou se mudar dela, terceirizando seu bem-estar e motivação no trabalho às circunstâncias, aos outros, ou à Instituição. O Apático atua sabotando a energia interior.

Sem prejuízo de outros, considero que esses sabotadores são os mais comuns no ecossistema profissional na atualidade. E que precisam de respostas imediatas e cotidianas, dos afetados por eles. Sendo o primeiro passo a identificação da intensidade, e de que maneira ele impacta o trabalho. Reconhecer sua atuação sobre nossas carreiras, é o primeiro passo para diminuir a intensidade de sua sabotagem sobre nós. Reconhecer, para neles operar, e criar forças para mudar. Caso contrário, eles criarão raízes que dificultarão o desenvolvimento do potencial humano.

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O autor é professor do IBMEC, aposentado do BB, proprietário da Ânimo – Desenvolvimento Humano; Autor dos livros: Sobre a Vida e o Viver, e, Apanhadores de Possibilidades nos Campos do Infinito; Psicólogo (UEPB), Mestre em Gestão Social e Trabalho (UNB), Especialista em Gestão de Pessoas (USP) e membro da Associação Internacional de Psicologia Positiva. Publica no blog de desenvolvimento pessoal e profissional em:https://bodecomfarinha.blogspot.com.br